Por Larissa Serpa e Catherine Gray
“Magra, eu? Imagina, eu uso tipo… 78”, “até parece, minha pele está mais para limão que para pêssego”, “é tudo shampoo seco, por baixo disso dá para fritar um ovo com toda a oleosidade dos meus fios”. Quando foi que se tornou mais comum dar uma dessas respostas a um elogio que um simples “obrigada”? Se o agradecimento ainda é seguido de um “sim, eu também adoro minhas coxas”, é como se automaticamente a crítica boa deixasse de existir para dar lugar às ruins – “na verdade, nem achei tão bonita assim” é uma das coisas que passam pela nossa mente quando a outra aceita o elogio.
Um estudo dos Estados Unidos descobriu que, no ambiente de trabalho, enquanto 80% das piadas entre homens são direcionadas aos colegas, 70% do humor feminino têm como alvo a própria autora. Usamos a autodepreciação até como uma maneira de nos conectarmos umas com as outras – é muito mais fácil fazer amizade com a colega do trabalho quando as duas concordam que o-d-e-i-a-m o próprio cabelo do que quando uma admite amar as madeixas.
“Se olharmos do ponto de vista de evolução psicológica, é compreensível. Homens são mais competitivos, enquanto mulheres sobrevivem melhor em grupo. É mais importante para nós não passarmos a imagem de intimidadoras e fazermos amizades”, aponta Denise Martiz, psicóloga norte-americana e autora de diversas pesquisas sobre o fenômeno da autodepreciação.
Um desses estudos, inclusive, mostra que mulheres são mais propensas a seguir o exemplo e falar mal do próprio peso se outras estão fazendo o mesmo em uma conversa. Até mesmo não entrar na onda e apenas ficar em silêncio foi visto pelas outras voluntárias como uma crença de que acha o próprio corpo perfeito.
E qual é o problema?
Superficialmente, não parece haver nada de errado em um pouco de humor sobre si mesma. Ter a capacidade de rir de si, na verdade, é uma característica adorável. Falar sobre suas falhas e mostrar vulnerabilidade pode quebrar barreiras e criar conexões mais reais.
Mas o problema é que enquanto usamos termos negativos para nos referirmos a nós mesmas na esperança de que outros nos aceitem, acabamos nos amando menos. “Estudos mostram que, quando usamos autocrítica negativa, isso nos puxa a um estado de maior depressão, se não estivermos 100% com nós mesmas”, diz Denise. “Acabamos nos sentindo mal com quem somos e isso vai se tornando um sentimento comum, como se o normal ou esperado fosse nunca estarmos bem.”
Um outro estudo recente descobriu que mulheres fazem uma autocrítica ruim em média 8 vezes ao dia. “Pensar de forma negativa e se diminuir em seu valor e capacidades mina a autoconfiança e a autoestima, destruindo a nossa capacidade de buscar o que se deseja. Nós somos aquilo que pensamos sobre nós mesmas”, diz Rosalina Moura, psicóloga de São Paulo. Não estamos falando apenas de problemas aparentemente leves, como um cabelo mal hidratado. O processo neurológico de repetição de uma ideia no cérebro o leva eventualmente a acreditar naquilo de uma maneira que tem potencial muito perigoso. “Veja o caso de pessoas com distúrbios de imagens, como anorexia. É possível que um dos gatilhos para a doença tenham sido anos de autodepreciação, que começou inocentemente”, diz Denise. (Um estudo notou que pacientes de anorexia se contorciam para passar por espaços estreitos, da mesma maneira que pessoas obesas fazem, mostrando que o cérebro delas realmente acredita que as gorduras impediriam o corpo de passar naturalmente.)
E isso não é nocivo apenas na aparência física. Um estudo da University College London, na Inglaterra, descobriu que mulheres constantemente subestimam a própria inteligência. Enquanto nós chutamos que nosso Q.I. (coeficiente de inteligência) está 5 pontos abaixo do que geralmente está, homens tendem a aumentar o deles.
A autodepreciação não afeta somente a maneira como nos sentimos mas também como os outros nos enxergam. De volta ao estudo sobre humor no ambiente de trabalho, todas aquelas piadas autodepreceativas não foram seguidas de risadas dos colegas. O que se constatou foi que apenas deixaram o ambiente mais desconfortável. Em outra experiência feita com professoras em sala de aula, foi observado que as que faziam piadas desse tipo como maneira de criar um laço com os alunos, na verdade acabavam criando precedentes para que eles não as respeitassem.
Liberte-se
Ainda assim, é difícil para mulheres falarem de si mesmas de forma confiante sem serem percebidas como arrogantes. Estudos mostram que aquelas em papéis de liderança precisam ter uma fala mais humilde que homens quando vão dar ordens, para não receberem o rótulo de “mandona”.
Mas existe esperança. “Quando mostramos mulheres que falavam de si mesmas de maneira positiva às voluntárias da pesquisa, elas não sentiram que aquelas pessoas iriam conseguir empatia de outros. Mas a justificativa foi que elas não achavam que outras mulheres gostariam disso, porém elas gostavam. O que mostra que, na verdade, nós queremos exemplos de mulheres que conseguem quebrar o ciclo de negatividade sobre si mesmas”, conta Denise.
Então tome essa iniciativa e seja você a primeira a mostrar o caminho. O primeiro passo é mudar o monólogo interno. Não que isso vá acontecer da noite para o dia – outro estudo da University College London mostrou que são necessárias 66 repetições para um hábito se enraizar no cérebro. Assim como leva um tempo para nos acostumarmos com um exercício físico, também leva alguns dias para nossa mente entrar em forma.
Uma dica é começar fazendo uma lista sobre suas conquistas pessoais. Isso ajuda a compensar a tendência feminina de focar no negativo quando o assunto é nós mesmas. Adicione um item novo toda vez que receber um elogio ou enfrentar um obstáculo.
Em situações de grupo, resista à tentação de adicionar gasolina à onda de autodepreciação. Lembra do estudo que mostra que mulheres são mais propensas a falar mal de si mesmas em uma situação em que outras estejam fazendo o mesmo? Ele também mostrou que ignorar era a melhor maneira de ajudá-las a parar de fazer isso. Apenas responda gentilmente quando a outra fizer comentários desse tipo (“é mesmo? Não tinha reparado”) e passe para outro assunto. Dessa maneira, você também ajuda a colega a não focar nisso, enquanto fazer o oposto e elogiá-la (“imagina, seu sorriso é lindo”) pode apenas dar continuidade ou incentivá-la a aumentar ainda mais a negatividade sobre ela mesma (“lindo? Cabe um dedo inteiro entre meus dentes”).
Só tome cuidado para não se colocar para cima às custas dos outros, através de comparações. “Não há nada de errado em falar bem de si mesma, porém exaltar as suas qualidades diminuindo as dos outros e não reconhecer suas limitações e imperfeições, por incrível que pareça, pode ser também uma forma de camuflar uma autodesvalorização”, aponta Roselina.
E comece a aceitar elogios. É mais fácil quando você pensa nisso como um favor à pessoa que fez o comentário. Um elogio, afinal, é um presente que a pessoa está dando a você de maneira gentil. Você jogaria de volta na cara dela se viesse embrulhado em uma caixa? Aceitar e agradecer não significa necessariamente que você concorda com ele, é apenas educado. Mas, se concordar, não há problema nenhum nisso. Aliás, você está linda hoje!
Sinta-se
Pode “se achar” sem ser arrogante, sim
Ajude os outros
Convenhamos, quando alguém está interessado em você – seja para um emprego ou relacionamento romântico –, eles querem saber sobre seus pontos positivos. Uma vez que você entende isso como uma maneira de ajudá-los a ouvir o que querem, fica mais fácil falar sobre suas conquistas.
Conte uma história
O tom arrogante aparece quando você coloca como você é incrível em uma lista – “eu fiz x, e então y e depois eu ganhei o prêmio z…” Contar suas conquistas na forma de uma história, mostrando os obstáculos enfrentados e aprendizados, deixa o tom mais simpático.
Anime-se
Apresentar-se de maneira positiva (seja em um café com alguém novo ou um evento de networking) é uma atividade que deixa qualquer uma nervosa. O segredo? Em vez de negar a ansiedade fingindo que está calma, redirecione-a, mostrando que está animada.
Dê conteúdo
Tem um motivo pelo qual pessoas amam tirar uma selfie na academia. Você exibe o tanquinho ao mesmo tempo que mostra que batalhou por ele. É mais simpático postar uma foto em uma conferência dizendo o que você aprendeu ali do que, dias depois, apenas postar sobre o quanto você sabe.