Dormir entre 22h e 23h da noite protegeria de doenças cardíacas? Estudo sugere que sim

Manter os horários das 22h ou 23h para começar a dormir poderia contribuir com o ritmo circadiano

 

Por Alexandre Raith, da Agência Einstein

Estudo britânico sugere que dormir entre 22h e 23h da noite estaria associado a um risco menor de desenvolver doenças cardíacas, em comparação com quem dorme mais cedo e, principalmente, mais tarde. Ao pegar no sono nesse intervalo, o organismo não seria tão afetado quanto quem dorme depois da meia-noite, por exemplo, já que o horário tardio aumenta a possibilidade de a pessoa não ver a luz da manhã — responsável por “reiniciar” o relógio biológico.

O trabalho, cujos resultados foram publicados no periódico científico European Heart Journal – Digital Health, avaliou as informações de saúde e de hábitos de sono de 88.026 indivíduos, fornecidas pelo banco de dados UK Biobank. Os horários de início do sono e do despertar foram coletados durante sete dias, com a ajuda de um acelerômetro (dispositivo que mede o movimento) em formato de pulseira. Todos os participantes foram avaliados para doenças cardiovasculares, como infarto, insuficiência cardíaca e Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Ao longo de quase seis anos de informações, os pesquisadores perceberam que 3,6% (3.172) dos indivíduos desenvolveram doenças cardiovasculares. Neles, a incidência foi maior entre aqueles que dormiam perto da meia-noite ou depois, e menor naqueles do grupo das 22h às 22h59.

Na análise dos dados biomédicos, em comparação com os indivíduos adeptos do horário das 22h às 23h, os pesquisadores verificaram:

• risco 25% maior de doença cardiovascular nos participantes que dormiam à meia-noite ou depois;

• 24% maior nos indivíduos que adormeciam antes da 22h;

• 12% maior naqueles que iam para a cama entre 23h e 23h59.

Em um recorte por sexo, a pesquisa aponta um risco ainda maior entre mulheres que dormem depois das 23h, em comparação com os homens. A explicação, para os autores, seria a diferença em como o sistema endócrino responde a uma interrupção no ritmo circadiano. No entanto, a idade das participantes pode ter gerado esse resultado, já que o risco de problemas no coração aumenta após a menopausa.

Os autores destacam ainda que os achados não mostram uma relação direta entre o horário de pegar no sono e os problemas cardíacos, e mais estudos são necessários para avaliar essa variável como um fator de risco independente — sem a interferência de outras condições. Caso comprovado, “o tempo de sono seria um alvo atraente para intervenções que visem reduzir o risco de doenças cardiovasculares devido ao seu custo mínimo e menor intervenção”, afirmam os pesquisadores no artigo publicado.

Sono e coração

O impacto da hora de dormir à saúde do coração estaria associado, dizem os autores, ao ritmo circadiano — espécie de relógio interno de 24 horas do corpo que regula o funcionamento físico e mental. Na literatura científica, há evidências que sugerem que uma perturbação desse ritmo poderia ser um fator de risco para doenças cardiovasculares, já que alteraria a pressão arterial, a qualidade do sono e o surgimento da aterosclerose (formação de placas de gordura nas paredes das artérias).

Mas esse talvez não seja o único culpado. Dormir entre às 22h e 23h pode sugerir uma maior regularidade nos hábitos de sono e vigília, de acordo com Dalva Poyares, neurologista pesquisadora do Instituto do Sono, o que favorece o funcionamento adequado dos relógios biológicos do organismo.

Além disso, pessoas que adormecem mais tarde ou mais cedo podem ter outros hábitos associados que motivam o aparecimento de doenças cardiovasculares. “Esse desalinhamento de comportamentos, bem como a variabilidade nos horários de dormir e acordar, aumentam a inflamação no organismo, e podem prejudicar a regulação da glicose. O que pode também contribuir para o risco de doenças cardiovasculares”, explica a especialista.

A neurologista acrescenta que, apesar de o estudo ter controlado alguns hábitos e comportamentos, os pesquisadores não consideraram a predisposição genética dos participantes. “É difícil ter o controle estatístico de tudo o que pode alterar o risco para doenças cardiovasculares. É possível que essas pessoas que têm regularidade de hábitos também tenham um estilo de vida mais saudável e apresentem menor probabilidade de desenvolver distúrbios de sono.”

Para a pesquisadora, outros fatores influenciam no risco, como a exposição à luz do dia, que ajuda a sincronizar os relógios biológicos, além da boa qualidade de alimentação e a prática de exercícios físicos.

Outra questão é que nem todo mundo costuma acordar ou dormir na mesma faixa de horário todos os dias. “Uma pessoa que é vespertina, ou seja, dorme mais tarde e acorda um pouco mais tarde que a média, poderá sofrer com dificuldades para iniciar o sono se for obrigada a dormir às 22 horas. Portanto, ela deverá privilegiar a regularidade dos horários e associar outros hábitos de vida saudáveis para reduzir o risco cardiovascular”.

(Fonte: Agência Einstein)

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