Os pesquisadores acompanharam a evolução de 425 pacientes entre seis e nove meses após a internação por meio de entrevistas e testes psiquiátricos
Por Gabriela Cupani, da Agência Einstein
Pacientes que tiveram Covid-19 moderada ou grave apresentam alta prevalência de transtornos psiquiátricos como ansiedade, depressão e estresse pós-traumático, além de perdas cognitivas relacionadas a memória e atenção, meses depois da alta hospitalar. Isso é o que mostra um estudo conduzido pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, publicado no periódico General Hospital Psychiatry.
O artigo apresenta resultados preliminares do acompanhamento de 425 pacientes que foram avaliados entre seis e nove meses após a internação. Todos foram pacientes internados no Hospital das Clínicas da USP entre os meses de março e setembro de 2020. Aqueles que precisaram de tratamento na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) foram considerados graves e os demais, moderados. Para o estudo, eles foram submetidos a uma entrevista psiquiátrica estruturada e testes cognitivos.
Os resultados do estudo apontam uma prevalência de transtorno mental de 32,2% neste grupo de pacientes pós-covid – um percentual maior do que o observado na população geral brasileira (21,1%). Dentre os principais transtornos observados, cerca de 8% sofriam de transtorno de ansiedade, contra 14,1% dos pacientes avaliados no estudo. Em relação a transtornos depressivos, os números foram, respectivamente, 2,8% na população geral e 8% dos pacientes acompanhados no estudo.
A pesquisa constatou que a própria inflamação causada pela doença e sua ação no Sistema Nervoso Central estariam por trás desses danos a longo prazo – a famosa covid longa. Isso porque, apesar de que o próprio estresse pode predispor os pacientes de Covid-19 a transtornos psiquiátricos, não houve correlação entre estes casos e fatores estressantes como a perda de um parente próximo ou prejuízos financeiros, nem com a gravidade ou tempo de internação.
Por ser uma doença nova, ainda não se sabe o alcance e a duração desses prejuízos. “Nos casos de depressão e ansiedade, temos observado uma boa resposta com os tratamentos usuais, que incluem medicamento e psicoterapia”, observa o psiquiatra Luiz Zoldan, do Hospital Israelita Albert Einstein.
O tratamento inicial costuma levar entre um e três meses para alívio dos sintomas e necessita de uma manutenção de seis meses a um ano, para redução do risco de recaída ou recidiva e recuperação do status clínico prévio. Os médicos têm observado que sintomas como redução da atenção, piora da memória e concentração, assim como cansaço, acabam melhorando com as intervenções adequadas e o tempo. Para os casos mais graves, há formas de fazer reabilitação cognitiva e treinamentos específicos.
Aumento global da depressão no mundo
O impacto da Covid-19 na saúde mental é um fenômeno mundial: só no primeiro ano da pandemia houve um aumento global de 25% nos casos de depressão e ansiedade, segundo um relatório recente da Organização Mundial da Saúde (OMS). Além da doença em si, condições como o isolamento social, perdas financeiras, medo e luto estão por trás desse crescimento.
Esse cenário traz o desafio de diagnosticar e tratar esses pacientes. “Um grande estudo recente, publicado na revista Lancet, mostra que, em países de baixa renda, apenas 27% dos pacientes portadores de depressão tem acesso a serviços de saúde mental, enquanto apenas 6% desses pacientes têm acesso ao tratamento farmacológico e psicoterápico adequado, por exemplo”, conta Zoldan. “Além disso são problemas de saúde cercados de estigma e preconceito da sociedade em geral, com isso, a própria pessoa pode demorar a reconhecer que precisa de ajuda”, continua ele.
Tanto é assim que esse artigo recém-publicado no renomado periódico Lancet chama a atenção para a necessidade urgente, especialmente em tempos de Covid-19, de saber lidar com o que eles consideram uma das principais causas de sofrimento evitável. E, como essas doenças impactam todos os aspectos da vida da pessoa, desde relações pessoais até a capacidade produtiva. O quanto antes forem diagnosticadas e devidamente tratadas, melhor.
Fonte: Agência Einstein
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